Arquitetura
Uma extensa topografia adentra o térreo e conforma o chão do pavilhão, convidando o visitante a experimentar de forma imersiva o processo de desmaterialização da concha do Sururu – triturada em diferentes granulometrias e disposta como relevo – e a sua re-materialização em paredes de bloco ecológico, que da topografia nascem para organizar e conter os diferentes usos e experiências propostas pela expografia.
Elevado sobre esse chão, um grande invólucro suspenso (62mx18m), construído em treliças de madeira engenheirada, revestidas por placas leves de resíduo de sururu, contém o programa complementar.
No primeiro pavimento, com livre acesso ao público, encontram-se a sala multimídia e o espaço cultural, além do restaurante, o café e a livraria em pé-direito duplo, com vista para o entorno do pavilhão e para o eixo de acesso da feira, sem ou com sutil suspensão do voo.
No segundo pavimento encontra-se a área administrativa e o lounge de autoridades, de onde se visita oxaão do café e a livraria, no nível inferior, e mais, do chão do pavilhão.
Uma cobertura espacial em “cubetas” de CLT conformada por domus portantes justapostos, banha de uma dramática luz zenital e mutante os interiores. Se em Osaka 70 a grande cobertura nervurada em concreto do Pavilhão brasileiro apontava potência por uma futura técnica, mais telúrica depois, o Pavilhão Osaka 25 nos traz a possibilidade de um outro futuro, mais leve, mais leigo social e ambientalmente.
A CATA E A TRANSFORMAÇÃO DO SURURU
Materialidade e Pesquisa
A tradicional atividade da cata do sururu, patrimônio imaterial do Estado de Alagoas, no nordeste brasileiro, é realizada por comunidades de marisqueiras e pescadores que se vinculam de lagoa em Mundaú – considerada por si e seus lagos-mãe. Essa atividade extrativista de baixo valor agregado, além de mísera, retira na comunidade do Vergel 300 toneladas/mês de resíduo pela deslama de conchas do molusco, gerando um grave problema ambiental e social.
O Entreposto de Sururu, nascido da parceria da comunidade com o IABS (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento e Sustentabilidade) por meio do Instituto Gente Transformando com apoio do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e Prefeitura de Maceió, nasce como um laboratório social e caminho circular criador de novas soluções, para o ciclo sustentável do molusco e base estudo para o aproveitamento e transformação dos 300 toneladas de seu resíduo em novos elementos e produtos.
As aparas foram reduzidas e classificadas de acordo com sua granulometria ativa. As cinzas resultantes em diversas granulometrias e submetidas a testes de laboratórios, segundo ensaios construtivos e composições específicas, proporcionaram um efeito visual lúdico com potencial de uma nova matéria arquitetônica sustentável.
Assim, o Entreposto opera promovendo o desenvolvimento social e econômico a partir da geração e revalorização de resíduos, da capacitação das catadoras e marisqueiras, e do incentivo a políticas públicas e ações que possam dar visibilidade a sua identidade, história e uso de seus saberes.
Essa experiência bem-sucedida, de valorização do capital técnico humano e ecológico, por meio da prototipagem de soluções de impacto, respeitando o tradicional com a ciência, vem criando benefícios ambientais, sociais e econômicos coletivos e para os indivíduos-fonte da cadeia.
A partir dessa compreensão, o Pavilhão do Brasil apresenta, como edifício-laboratório imersivo, dar visibilidade e rever o processo de base sururu e suas transformações de comunidades em um símbolo similar com os Institutos de Pesquisas de países europeus e com Universidades do Japão e de terras indígenas com interesse no potencial regenerativo desses assentamentos.
Pretende-se o compartilhamento de histórias, reflexões e saberes locais com o público do evento – e cumprir seu papel social ao integrar o conhecimento científico, artístico e social com o saber tradicional da cata e da transformação do sururu, como uma nova forma de produção e de vida – demonstrando o desenvolvimento social e ambiental norteador de um futuro possível.
EXPOGRAFIA
Cartografia Cultural da nova bioeconomia regenerativa
Como podemos enxergar, a partir de um caso concreto de empoderamento comunitário, o mapa dos Saberes do Brasil, que atravessa os diferentes grupos que vêm da floresta e das águas, no contexto da tecnologia e inovação, parte à estruturação de um novo paradigma de desenvolvimento, que valorize a inclusão e o diálogo justo com os povos e territórios?
Partindo da experiência concreta do Sururu, essa cartografia propõe uma curadoria feita por mulheres, ribeirinhas indígenas e quilombolas, reunindo saberes de narrativas afrodescendentes, do conhecimento sobre a biotecnologia e economia da terra, tendo a criticidade e a construção de reputação dos saberes tradicionais e ancestrais como pilares de reconstrução identitária e como estratégia de superação da desigualdade e injustiça climática e promoção da justiça e dignidade das comunidades povos tradicionais, ciência e os agentes econômicos.
O espaço expositivo do Pavilhão do Brasil em Osaka convida o visitante a caminhar em um novo chão, do extrativismo da cata do sururu ao redesenho da bioeconomia de futuro, onde a cultura dos saberes se transforma em uma afirmação de novos parâmetros de valor, de inclusão e de ancestralidade como referência de um novo sistema de bioeconomia ética e regenerativa.
A exposição é antecedida ao rito, que a Guarani Mbya, do território Jaraguá, em São Paulo, entrega à energia feminina presente por guardiã e ancorar.
Nessa atmosfera imersiva e sensorial, a exposição contorna com múltiplas camadas, ressignificando o visitante de conhecimentos inspiradores que geram o sentimento de ancestralidade como base para a inovação e a sustentabilidade, num campo de atuação da curiosidade – mais sabedoria durante a vivência.
A exposição Cartografia Cultural da Diversidade Brasileira propõe uma lente e estratégia, um novo posicionamento do Brasil, que se atreve a criar e demonstrar, inclusive no exterior, uma nova economia, sustentável, inclusiva e regenerativa.
em parceria com AR Arquitetos
CASA AO TEMPO
“A arquitetura lida com a noção de tempo de uma forma particular. A duração de um projeto resume-se a um instante mínimo, quando comparado com a idade do sítio em que se intervém, ou com a expectativa de permanência do edifício que se prevê construir. O exercício do projeto representa assim um esforço de assimilação, durante o qual esses tempos são convocados e comprimidos, ensaiando-se uma proposta de interpretação que os articule e da qual resulte uma continuidade legível. Se o tempo em si corresponde, de algum modo, à sobreposição estratificada dos sucessivos presentes, a arquitectura assemelha-se a uma arqueologia da transformação.”
Manuel Aires Mateus
O Concurso Vila dos Mellos nos convoca a refletir sobre o papel da arquitetura - e da ‘casa’ - na construção ‘um novo e verdadeiramente contemporâneo formato de vida coletiva rural’. Neste âmbito, qual seria a expressão de uma arquitetura rural inovadora, respeitosa do entorno, e livre de dogmas ou ideologias?
A vida no campo, à diferença da vida urbana, se desenvolve em plena integração com a natureza
e seus ciclos temporais e ambientais. Nesta condição, todos os indivíduos e agrupamentos, independente de local, cultura ou classe social, são igualmente suscetíveis a um Tempo que não é o do homem moderno, mensurável e controlado.
Neste sentido, o tempo compacto e preciso da arquitetura se coloca à disposição do tempo dilatado da natureza e sua livre transformação. É justamente neste espaço intersticial que reside o sentido do Habitar. A casa imprime, em sua simples presença, o passo incontrolável do tempo o sobre o qual somos chamados a intervir. A expressão que resulta é singela; mas ‘intensa e poderosa’.
A relação atemporal e infinita nos recorda da finitude de nossa existência, e a põe em contraste com a larguíssima continuidade do tempo fora do destino individual de cada um e da coletividade.
Ao pensar no Habitar desprovido de ideologias ou estilos, cabe-nos a beleza de organizar a força da pátina do Infinito Tempo sobre a métrica do constructo humano.
Neste sentido, e em consonância com o propósito do Habitat Vila dos Mellos, optou-se por utilizar um sistema predominantemente em madeira. Primeiro por se tratar de matéria-prima renovável, de baixa pegada ambiental (maior sequestro de carbono, menor energia requerida para transformação / industrialização) e alto potencial de utilização, mas também por ser um material leve, durável e de fácil manutenção e substituição. Mas sobretudo por se tratar de material altamente suscetível às marcas da passagem do tempo, o que em si constitui valor fundamental do registro da presença do homem e da coletividade junto à natureza. Por se tratar de um material orgânico, o resultado estético vai se transformando permanentemente, tornando cada casa e o conjunto delas um organismo vivo em permanente mutação.
MEMORIAL JUSTIFICATIVO
Nesta etapa, foi utilizado o TERRENO típico ‘A’ (aquele em declive a partir da via pública). A casa se IMPLANTA em sua porção superior, mais próxima à rua, paralela às curvas de nível e solta do chão, para reduzir ao mínimo a distância de acesso, bem como o trabalho de terra e os pontos de contato com o solo, deixando cursos d’água e da fauna livres de interferência.
A solução de PLANTA apresenta grande flexibilidade de composição e ampliação, organizada longitudinalmente em três faixas: a sul, junto ao terreno, estão os espaços servidores, ou seja, a linha hidráulica (fácil acesso e manutenção) e o acesso por meio de deck externo; a norte, voltadas para a vista, estão as áreas servidas, de estar e dormir. Entre elas, a faixa de 1 módulo de largura garante e organiza a livre circulação, agregando área ao ambiente de estar.
Em sua versão menor (56m2), a casa possui sala (22m2) e um dormitório (10m2), além de dois núcleos hidráulicos (5m2), sendo um módulo de Cozinha + Área de serviço, e outro de banheiro compartimentado (w.c. + lavatório + chuveiro c/ trocador). Além de um deck no lado de serviço e outro social, parcialmente cobertos.
Em sua versão ampliada (2 dormitórios) a casa passa a ter 73m2, contando com um terceiro núcleo hidráulico, que pode compor uma suíte com ou sem banheira, ou servir como AS externa, depósito, rouparia, entre outras opções (ver prancha).
A ESTRUTURA industrializada modular em MLC da ITA Construtora, parte da modulação 1.2m x 1.2m, com pilares a cada 3 módulos e balanços de 1, explorando a defasagem em relação aos vedos para alocar aberturas. Isto gera grande liberdade compositiva e facilidade de ampliação futura. Num eventual desenvolvimento do projeto, pretende-se realizar o ajuste dimensional entreeixos de forma a garantir o máximo aproveitamento de componentes com o mínimo trabalho (ex. cortes de placas).
Os VEDOS EXTERNOS são do tipo LWF (Light Wood Frame) com envelopamento climático, com acabamento interno em gesso acartonado pintado e externo em sistema de fachada ventilada com madeira nativa de alta densidade. Rufos metálicos galvanizados, além de protegerem as aberturas e topos de fachada, prolongam-se horizontalmente, gerando diferentes exposições às intempéries mesmo em faces coplanares, imprimindo sobre a PELE da casa as variantes decorrentes dessas diversas ações do ambiente (numa combinação cronológica imponderável de umidade, exposição solar).
É essa marca indelével e genuína, advinda do imponderável, que estabelece a presença finita do homem, submetido ao tempo infinito da natureza, permitindo à comunidade reconhecer-se - e medir sua presença na paisagem.
Os PISOS internos serão todos executados em assoalho de madeira Cumarú fixado diretamente sobre o barroteamento, dispensando-se a utilização de lajes secas para redução de custo do conjunto. Pode se prever o fechamento sob os barrotes para melhor performance térmica. Nas áreas externas o assoalho será substituído por decks e chuveiro receberá piso-box.
A COBERTURA, primeiramente pensada como um teto-jardim (substituido por questão de custo), será executada em telha termo-acústica com isolamento complementar e forro de gesso acartonado.
O sistema de ESQUADRIAS em madeira e vidro procura resolver acessos e ventilação da forma eficiente e econômica. Um único sistema, sempre recuado e protegido, composto de porta de madeira com vidro e uma tapadeira opaca pivotante vertical, resolvem duplas circulações e acessos ao/do exterior, possibilitando ventilações cruzadas da área social em ambas as direções. As vistas, tanto no quarto quanto na sala, resolvem-se com vidros fixos sem caixilho: um grande e central, piso-teto na sala; e um de canto no dormitório, sob o qual uma tapadeira opaca de madeira tipo maxim-ar resolve a ventilação cruzada complementada sobre o armário na parede oposta, a qual tira proveito do recuo da caixilharia lateral.